A urgência da emoção
Por Alexandre Honrado
A formatação das mentes – seria melhor dizer, a construção social de mentalidades – é um produto da cultura institucional difundida pelos centros considerados aptos a aspergi-la, vem de órgãos de poder, dos Ministérios aos órgãos de comunicação passando pela teia áspera e plural do poder empresarial, local, dos “formadores de opinião”, da opinião publicada que ser esforçar-se e ser opinião pública – e procura criar uma rede coerente de obediências a que chamamos, não muito acertadamente, uma identidade (num falso desejo coletivo de anular a personalidade e a individualidade?).
Esta formatação esbarra com a realidade: somos pequenos universos culturais, temos heranças genéticas e étnicas (mesmo meio esquecidas com o tempo e a distância), sofremos os efeitos da amnésia transcultural, recordamos e esquecemos de acordo com solicitações de adrenalina e da cada vez mais estudada amnésia psicogénica, procuramos lógica no individualismo e no indivíduo, viramos costas a um dos valores mais consentâneos e expressivos que nos podem garantir a sobrevivência: o lado humano emocional.
Quem estuda estas matérias esforça-se cada vez mais por entendê-las, todavia é o campo mais vasto para uma rigorosa coleta de dados e o contacto intersubjetivo entre o investigador e o seu objeto é de uma exigência superior, pois cada ser humano não é, definitivamente, uma ilha isolada e é esse, e primeira e última instância o objeto de estudo.
Não há aferidores de inteligência capazes de distinguir inequivocamente este do outro, dada a subjetividade do tema, mas sabemos que o trabalho contínuo sobre elementos a que chamamos “inteligência emocional” equivalem a entender que é dessa capacidade (dos afetos, em soma) que produzem sociedades mais desenvolvidas, mais capazes de equidade e mais justas no seu todo.
O mundo do trabalho já percebeu esta enorme mais-valia e aposta em matrizes de promoção emocional nos seus ambientes específicos.
Uma sociedade que não conhece os seus sentimentos, não os reconhece e se não reconhece os seus próprios é incapaz de reconhecer os sentimentos alheios. Essa concha fechada é perigosa, gera ambientes tensos, musculados, autoritários, impotentes e sobretudo doentes. Uma sociedade doente não progride – ou para usar uma expressão mais económica: não rende.
A inteligência emocional relaciona-se diretamente com a motivação, gera progresso e o único ambiente em que pode progredir: a paz.
Dois monómios em presença – dificuldade e oportunidade – só podem constituir binómio (uma soma otimizada dos dois termos) com uma perceção ótima da afetividade que conduz ao crescimento. A fórmula é aplicável a qualquer ambiente, de trabalho, ócio, lazer, da empresa e da sua “cultura” ao espaço escolar, às bancadas dos estádios, às assembleias de freguesia, município ou da República.
Por mais lógico que seja o idiota, sem cultura emocional não tem qualidades nem competência social.
Na formatação das mentes, nas construção social das realidades, tarefa quotidiana, é exigível o reconhecimento de alguns degraus que nos conduzam mais alto (a plataformas de existência com mais firmeza, mais justiça, mais solidez pessoal e coletiva): formar para reconhecer os sentimentos, promover a interação emocional com os sentimentos, apostar na autoconsciência, que está longe de ser o egoísmo ou a ilusão de ter a solução dos problemas sem necessidade do outro.
A vida é tomada de decisões – e não abstinência, abstenção, bestialidade, descrédito próprio e alheio.
As nossas aptidões são requeridas, na totalidade, em tempo de crise. Já passámos por muitas. Emocionemo-nos com mais uma.
Sem inteligência somos quase nada. Sem inteligência emocional somos mesmo nada.
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